"Há seis anos que uma carrinha da Biblioteca Municipal de Penafiel percorre, diariamente, as freguesias do concelho, levando livros às escolas básicas e jardins-de-infância. Se assim não fosse, muitas crianças nunca teriam, provavelmente, a oportunidade de contactar com um vulgar livro de histórias. E quando o Bibliomóvel, nome dado à viatura, chega à escola é dia de festa.
Em Cabeça Santa, uma das 38 freguesias de Penafiel, as crianças da EB1- Assento n.º 3 e do Jardim-de-Infância de Comunha, instaladas no mesmo edifício, esperam ansiosas pela carrinha dos livros. Alguns já conhecem a biblioteca ambulante, mas, desta vez, além de requisitar um livro, vão ouvir a jovem Cátia Silva, de 21 anos, a contar uma história de Natal.
Mal chega a viatura, conduzida por Rui Guedes, técnico de biblioteca e funcionário da Câmara de Penafiel, as professoras, já informadas da visita, procuram travar a euforia da pequenada. Já na sala de aulas, Cátia Silva, estagiária prestes a concluir a licenciatura em Gestão de Património, instala um pequeno projector de slides e começa a ler "a historinha das renas do Pai Natal". As 39 crianças do 3º e 4º ano ficam mudas, seguindo o enredo.
"Há crianças que nunca viram um projector de slides", garante, mais tarde, a estagiária. Durante um mês, Cátia promove, gratuitamente, a "Hora do Conto", nome dado à iniciativa pela Biblioteca Municipal. "Até sexta-feira, quando acabar a iniciativa, já devo ter mais de 25 horas de conto lidas a mais de mil crianças", estima a animadora cultural.
Cabeça Santa é uma das freguesias mais problemáticas, do ponto de vista social, de Penafiel, mas "já foi muito pior", recorda a professora Mafalda Rocha, com duas décadas de ensino no estabelecimento.
"Os pais colaboram muito com a escola e só posso dizer bem desta comunidade", frisa, recordando que, quando chegou a Cabeça Santa, "havia muita droga e muito álcool". "Era uma comunidade de extrema pobreza, com gente que nem dinheiro tinha para comer. Hoje, notamos que há melhores condições de vida. Só que os pais, apesar de serem muito amigos da escola, anseiam que os filhos acabem a escolaridade obrigatória para irem trabalhar. Aqui, os homens ou emigram ou trabalham nas pedreiras; e as mulheres estão empregadas em fábricas de confecções". A visita do Bibliomóvel "enriquece a comunidade e as crianças adoram".
Rui Guedes, 32 anos, conduz a carrinha desde 8 de Abril de 2002, quando a iniciativa arrancou. Conhece todos os cantos do concelho e todas as escolas. "As crianças adoram ler. Certo dia, apareceu-me uma criança a requisitar um livro que me pareceu inadequado à idade. Sugeri-lhe outro livro, mas ela insistiu. Avisei-a de que queria saber a história do livro. Quando regressei à escola, ela devolveu-me o livro e eu perguntei-lhe qual era o tema. "Mas era para ler ou para fixar o texto?".
Para este técnico de biblioteca, "a carrinha leva cultura e vida" e, "se assim não fosse, muitas crianças nunca saberiam o que era uma biblioteca". Desde 2002, que tem disparado o número de leitores, graças a este evento. "Faço mais de mil quilómetros por mês, com cerca de 2500 volumes", garante. "
José Vinha
Fonte: Jornal de Notícias -12-12-006
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